terça-feira, 2 de junho de 2009

Tradições Varzeenses - As pulhas

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 15 DE MARÇO DE 1991)

Estes folguedos de Entrudo, a que se podem juntar outros, como as “Caqueiradas”, mais velhos que o tempo e que sem origem bem definida, espalham-se por muitas terras do País mas ainda que a base da actuação seja semelhante, variam muito de zona, de região para região.

No “Bairro de Santarém” esses costumes mantiveram-se até à década de cinquenta, pelo menos no que se refere à freguesia da Várzea.

Os jovens de hoje desconhecerão totalmente tais costumes, tal como a terceira idade desconhecerá os seus. É o eterno conflito de gerações.

Iremos agora tentar dar a conhecer o mais aproximadamente possível, como funcionavam na zona estes folguedos.

A pulha é um gracejo praticada no Entrudo e que consiste em provocar uma pergunta a que se dá uma resposta já preparada e que encerra escárnio. (1)

Na noite combinada, juntavam-se os homens que se dividiam em dois grupos, procurando lugar alto e bem situado, a fim de se poderem ouvir reciprocamente e serem ouvidos em toda a aldeia.

Em Vilgateira era hábito escolherem o palheiro que pertenceu a Manuel Cordeiro, durante muitos anos regedor da freguesia e uma “varanda” da casa de João Laranjeiro, taberneiro na aldeia.

As pulhas visavam todos os acontecimentos “importantes” que durante o ano se davam com maior ou menor clareza na aldeia.

Ainda que o nome das pessoas não fosse dito, o conteúdo da pulha era claro para identificar o visado. Havia porém uma ou outra que raros compreendiam e que intrigava as pessoas.


[Vilgateira, década de 80 do século passado. Foto JV]

Referiam-se normalmente a factos ainda em embrião ou que foram muito pouco conhecidos na altura. Por vezes só tempos depois se concluía que a pulha tal tinha sido para fulano ou beltrana, porque entretanto o “assunto” tinha chegado ao domínio público.

A pulha começava sempre por “ASSIM COMO É VERDADE” (uma afirmação plena de veracidade) e terminava com “É VERDADE, É VERDADE, É VERDADE!” (confirmação absoluta da afirmação feita).

Era “deitada” por um grupo e respondida pelo outro, tudo isto prévia e cuidadosamente preparado.

Durante o ano diziam uns para os outros: - Fulano ou fulana, este ano não se livra de ir às pulhas.

Os mais idosos lembram-se bem delas, conseguindo mesmo reproduzir algumas que pela sua acutilância e estrondo ficaram bem no ouvido e na memória.

A grosso modo poder-se-ia dizer que as pulhas constituíam um tribunal popular local