segunda-feira, 12 de outubro de 2009

O Grupo Desportivo Bairro dos Combatentes, "Agremiação Popular"

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 23.04.1993)

Numa das MEMÓRIAS anteriores, falámos do futebol e da acção que provocava no MEU BAIRRO – ia desde os clubes de Lisboa, aos da “terra”.

Deixámos para uma MEMÓRIA própria, que eu penso justificar-se, do que foi o Grupo Desportivo do Bairro dos Combatentes.

Ainda hoje, quando encontro velhos amigos do MEU BAIRRO, que há muito não vejo, é assunto que vem sempre à baila.

Tenho vários dados concretos (que na altura escrevi) sobre o assunto, que por ora não posso consultar, não sabendo mesmo se alguma vez o venhamos a fazer. Mais uma vez, é à memória que recorremos, apesar das lacunas que nos oferece. Temos contudo recebidas algumas informações de leitores amigos, “gabando-nos” a memória e que só eu os faria recordar coisas de que já não se lembravam!

A rapaziada do MEU BAIRRO, no meu tempo, dava uns toques na borracha, como então dizíamos, no átrio da escola primária, mas o local era proibido para o fazer e a polícia aparecia com muita frequência. Já espigadotes, tínhamos vergonha de sermos obrigados a fugir. Onde jogávamos, não era possível partir vidros e o único inconveniente que podia haver era podermos sujar um pouco uma das paredes laterais, onde a bola batia. Isto só acontecia se a bola estivesse enlameada, o que raramente acontecia.

[Equipa do G.D.B.C.:- De cima para baixo e da esquerda para a direita - Manuel Custódio, Virgílio, "Lelo", Joaquim José, Jaime, Alberto e António Carlos; no primeiro plano, António Miguel, Carlos Torgal, NN, António Martinho e António Oliveira]
Nunca os jovens do MEU BAIRRO assaltaram a escola, partindo tudo o que encontrassem pela frente, em puros actos de selvajaria e vandalismo. O nosso crime era querermos jogar à bola num local que nos oferecia o mínimo de condições! Ai tempos, tempos!
Com a construção do Palácio da Justiça (eu ainda sou do tempo do velho Tribunal, ao Canto da Cruz) obra efectuada pelo trabalho de presos vigiados por guardas prisionais em guaritas estrategicamente colocadas e a abertura das vias do Campo Fora-de-Vila (Campo Sá da Bandeira) houve necessidade de arranjar novo local para as feiras e mercados da cidade:- Nª Sª da Piedade, SS Milagre, Feira do Ribatejo acabada de criar e mercados mensais de gado. Eram então os certames conhecidos e hoje muito mais alargados, alguns que nem sequer conheço.

Era um olival, se a memória não me atraiçoa, da conhecida Família Telhadas.

Depois de terraplenado, o que devia ter acontecido por volta de 1953, ficámos com um óptimo campo para jogar futebol, já que nessa altura não havia qualquer construção e ninguém nos proibia de tal. Como ficava perto do MEU BAIRRO, era fácil utilizá-lo.

Lá fazíamos os nossos treinos, principalmente na época de férias e tínhamos de esperar por aqueles que estavam a trabalhar, que saíssem dos empregos.

Começou a nascer a ideia de formar um grupo, havendo necessidade de arranjar local onde nos reuníssemos. Obtive a concessão, por parte de meus pais, que nestes assuntos sempre me deram total apoio, da cave do prédio que habitávamos. Levámos para lá a luz eléctrica, fizemos de caixotes que arranjámos aqui e ali, bancos e mesas. Tínhamos jogos de damas, livros e revistas (antigos).

Era a nossa sede, como pomposamente lhe chamávamos e lá nos juntávamos diariamente no tempo de férias, para muitos, depois do jantar.

Quotizávamo-nos e fazíamos sorteios conseguindo assim angariar os patacos necessários para comprar bola, camisolas, que numerámos e calções.

Entretanto a “malta” da zona da rampa dos Ciclistas (Rua Capitão Montês) actuaram no mesmo sentido, formando o seu grupo que baptizaram de “Os Terríveis”, equipando de camisola azul e calção branco. Do outro lado, era a “malta” do Matadouro mas que não posso precisar se chegaram a comprar o equipamento semelhante ao nosso. Talvez sim, sendo as camisolas vermelhas.

[Antes dos jogos e com apoiantes.]

O “G.D.B.C” que equipava de camisola amarela e calção branco, começou a ser conhecido no MEU BAIRRO e até a merecer alguma estima dos adultos. Um entusiasta arranjou uma grande bandeira de seda amarela e branca e onde colocou o emblema do clube, de minha autoria e pintado a óleo. Ficou a constituir o nosso “estandarte”, acompanhando-nos nos jogos que efectuávamos.

Ainda que o nome oficial fosse o que titulou esta MEMÓRIA, o grupo era conhecido pelo Grupo da Avenida, em alusão à artéria principal do MEU BAIRRO.

Se a rapaziada mais velha era entusiasta, os mais novos não lhe ficavam atrás. Estavam sempre esperando pela falta de algum mais velho para poderem alinhar.

Assistiam aos jogos com grande entusiasmo, chegando mesmo a acompanhar a equipa quando jogava fora, afinal o que mais desejávamos.

Se umas vezes as equipas visitadas nos pagavam as viagens nos transportes públicas, outras pagávamos nós.

A primeira deslocação que fizemos foi a Vila Nova de S. Pedro, interessante aldeia do concelho de Azambuja, donde era natural um amigo que na época de aulas se hospedava numa casa da Rua 2º Visconde.

[No desaparecido Estádio Alfredo Aguiar, dos Leões de Santarém. Antes dos jogos, com o estandarte.]
Lá se combinou o jogo e no dia marcado tudo seguiu na “carreira” a caminho do Cartaxo onde apanhámos ligação para Vila Nova.

Lá ia a cesta de verga que continha duas divisões e pintada de vermelho. O Maroca Santana levava a “farmácia” a fim de prestar a “assistência” a quem necessitasse!
Ganhámos o jogo, penso que por três a um com grande exibição do nosso mais jovem jogador, que alinha a extremo-esquerdo, como se dizia nessa época, o Carlos Torgal que marcou pelo menos um golo.

Sem pretender formar a equipa que jogou, recordo o recentemente falecido, Joaquim José (Aguiar), os irmãos Jusa (José Francisco e António Augusto), o António Martinho, uma pedra sempre influente, além do mais, com as suas partes gagas, os irmãos Cardoso (Virgílio e Hernâni), António Oliveira, um polivalente e o José Luís (Colaço).

Depois do jogo, houve um petisco em caso do nosso amigo onde pontificava o chouriço assado e pão fabricado por um dos intervenientes no encontro, acompanhado naturalmente por um copo de tinto, saído do casco ali ao lado.

Quando fomos para o baile, ficámos desiludidos pois era baile de roda a que não estávamos habituados.

Se a satisfação era grande quando partimos, o regresso foi mais eufórico pois trazíamos uma vitória no “bornal”. Lembro-me que nesse dia fui para Almeirim onde episodicamente se encontravam os meus pais. Cheguei por volta das onze da noite o que já causava preocupações aos meus progenitores! Nessa altura, um rapaz com dezassete ou dezoito anos já era tarde chegar às onze horas da noite; hoje uma moça de catorze ou quinze anos é cedo chegar às três da manhã!

Efectuámos jogos em várias terras circunvizinhas, como Pernes, Alcanhões, onde o jovem Fernando Fontes fez grande exibição, Vale de Santarém, Várzea (Vilgateira) e Graínho. Aqui dava-se a circunstância de no campo haver duas oliveiras, que tínhamos de “fintar”!

Quando jogávamos em “casa”, utilizávamos o estádio Alfredo Aguiar, com Luís de Melo a aturar - nos , ou então o Chã das Padeiras.

Também nos lembramos de ter formado uma equipa de jovens para defrontar em jogo treino igual equipa dos Leões”. O treinador Artur Quaresma, que morava no MEU BAIRRO e apoiava a nossa equipa, aceitou o desafio “impondo nós a condição dos residentes no bairro alinharem pelo GDBC e não pelos Leões, onde estavam inscritos.

Não posso precisar o resultado, mas penso que consigo recordar a equipa que formei, assim constituída:- Fernando Fontes, Fernando Cabo, Fernando Alves e Carlos Rodrigues; Emídio Aguiar e Carlos Cabo, Rui Manhoso, João Torgal, Costa, Carlos Torgal e Waldemar Gonçalves.

Lembro-me que Artur Quaresma dizer que o Carlos Torgal já era muito grande, efectivamente assim acontecia em relação aos outros. O Carlos, nessa altura dava para tudo e veio a ser, vários anos titularíssimo na equipe de “Os Leões”, que ajudou a vencer o Nacional de III Divisão.

Nesta jovem equipa, muito homogénea e capitaneado pelo Emídio, alinhava a extremo direito um grande entusiasta do grupo, o Rui Manhoso, actual Presidente da Associação de Futebol de Santarém e cujo gosto pelo dirigismo, talvez o tivesse obtido no GDBC, como recentemente nos confidenciou.

Ainda que o grupo procurasse alinhar com a “malta” que residia no bairro, também procurávamos efectuar as nossas “aquisições”, lembrando-me de duas nas quais tive influência, pois tratavam-se de colegas de liceu, o completíssimo Correia Bernardo, para os amigos Niza, excelente guarda-redes, que alinhava a qualquer lugar, incluindo extremo-esquerdo Foi o desportista mais completo da minha geração.

Distinto oficial do Exército, o nosso velho amigo, Coronel Correia Bernardo, mantém-se em Santarém onde comanda O D.R.M.. O outro foi Fernando Lucas, conceituado industrial na cidade, habilidoso atacante que ainda há pouco e em sua casa me recordava esses tempos e a circunstância de o ter encarregue, como capitão da equipa, de marcar uma grande penalidade que, com uma biqueirada, ... falhou!
Alguns desses jovens de então, que hoje seriam cinquentões, infelizmente já não se encontram entre nós, como é o caso do José Torgal, do António Carlos (Tocá) e do Joaquim José, isto os que são do meu conhecimento.

Não posso terminar esta MEMÓRIA sem referir os jovens que deram vida ao e que de momento vêm à minha memória:- os irmãos Torgal (José, Carlos e João), os irmãos Cardoso (Virgílio e Hernâni), os irmãos Aguiar (Joaquim José e Emídio), os irmãos Correia (Jaime e Manuel), os irmãos Jusa (José Francisco e António Augusto), António Martinho, José Luís Colaço, João Fernandes, Alberto (Beta), Manuel Custódio, José do Seixo, Júlio Porfírio, António Oliveira e outros.

Muitos deles, não os vejo há mais de trinta e cinco anos nem sei por onde param.
Naturalmente que a vida nos traçou rumos diferentes, cada qual seguiu a sua profissão. Enquanto uns se mantiveram na cidade e mesmo no MEU BAIRRO, outros fixaram-se por esse país fora, alguns bem distantes.

***

[Equipa do G.D.B.C.De cima para baixo e da esquerda para a direita:-Manuel Custódio, João Fernandes, Fernando Lucas, Romão, António Martinho, Jusa I, Jusa II, António Miguel e Correia Bernardo. Primeiro plano e pela mesma ordem: Mário Leal, Hernani Cardoso, Carlos Torgal, José Luís e Alberto]
Ainda que nada tenha a ver com o futebol, não posso deixar de lembrar aqui um facto que nunca desapareceu da minha MEMÓRIA.

Aqueles que frequentavam o liceu e estabelecimentos similares, adquiriram algum interesse por outras modalidades, como acontecia com o voleibol, basquetebol e atletismo.

Lembro-me do brilharete alcançado pela Associação Académica de Santarém no 1ºPasso, uma organização do Sporting Clube de Portugal e apoiado por um jornal desportivo.
Acontece que enquanto eu procurava dedicar-me ao salto em altura, havia um amigo que estava muito interessado no lançamento do peso. Conseguiu arranjar um peso de chumbo, proveniente de uma roda de balanço de uma qualquer máquina, mas que tinha o feitio de uma pêra, o que muito o desgostava e segundo dizia, não lhe proporcionava o treino adequado. Logo me propus tornar o objecto esférico e ainda que não o tivesse conseguido, pelo menos ficou mais parecido.

O meu “velho” amigo acabou por se licenciar em Educação Física!
Lembraste Victor?