quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Pereira Caldas

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 15 DE JUNHO DE 2007)


José Garcês Pereira Caldas nasceu na freguesia de Marvila do concelho de Santarém a 26 de Novembro de 1895.

Frequentou o Liceu Sá da Bandeira na sua cidade natal, passando depois para o de Passos Manuel, em Lisboa.

Mobilizado, fez parte do Corpo Expedicionário Português, partindo para França em Junho de 1917, como alferes miliciano de artilharia. Em Fevereiro do ano seguinte foi promovido a tenente, regressando a Portugal em Agosto, indo prestar serviço no Regimento de Artilharia de Costa e igualmente no Arsenal do Exército, o que aconteceu até finais de 1920, altura em que foi desmobilizado. Ganhou em Campanha a medalha da Vitória.

Em 1921 concluiu o curso de engenheiro-agrónomo no Instituto Superior de Agronomia, da Universidade Técnica de Lisboa.

Ingressou no quadro de engenheiros-agrónomos do Ministério da Agricultura após a conclusão do curso.

Em 1927 foi nomeado professor da Escola de Regentes Agrícolas de Santarém, onde se manteve até 1931, altura em que foi nomeado Governador Civil de Santarém, funções que exerce até 1935.

Foi delegado do Governo entre 1933 e 1937, na Federação dos Viticultores do Centro e Sul de Portugal, exercendo já em 1937 o lugar de vogal da Junta de Colonização Interna, a que passou a presidir a partir de Abril de 1941.

No seu tempo são criadas as colónias agrícolas da Gafanha e de Pegões.

Nomeado subsecretário de Estado da Agricultura em 16 de Outubro de 1948, funções de que é exonerado em 1950.

Em 1949 nomeou uma comissão para reorganizar o plano industrial da feitura do azeite e seus derivados e dá-se maior protecção às cooperativas leiteiras de norte a sul do País.

Fez parte de missões de estudo à Itália, Espanha e Suiça e realizou várias conferências sobre assuntos da sua especialidade.

Faleceu em Lisboa a 3 de Julho de 1958.

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Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Vols. 21 e 40
Santarém no Tempo, Virgílio Arruda, 1971
Boletim da Junta de Província do Ribatejo, 1937/40, pág. 690
História de Portugal, Joaquim Veríssimo Serrão, Vols. XIV e XV

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Braz Ruivo

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 24 DE NOVEMBRO DE 2006)



Augusto Braz Ruivo, de seu nome completo, nasceu na cidade de Santarém, mais propriamente no “Largo do Seminário” em 3 de Maio de 1906.

Depois de terminar o curso no Liceu de Sá da Bandeira, na sua cidade natal, acaba por ingressar nos quadros da Caixa Geral de Depósitos, como funcionário.

Desde muito novo revelou excepcional aptidão para as artes plásticas e recebe as primeiras lições do pintor de arte, António da Saúde que dava aulas no liceu de Santarém.

Naturalista por excelência, dedicou-se ao levantamento da monumentalidade escalabitana, reproduzindo através do óleo, aguarela, carvão ou sépia, além do património edificado, as paisagens circundantes.

Esta dedicação levou-o a colaborar, ilustrando Santarém, lenda e história, de Eugénio de Lemos, 1940, em Santarém, História e Arte, de Joaquim Veríssimo Serrão, 1950 e em Santarém no Tempo, de Virgílio Arruda, 1971.

Prestou igualmente a sua colaboração no restauro efectuado na igreja do antigo Hospital da Misericórdia de Santarém.

Em finais da década de trinta os seus trabalhos deram origem a uma colecção de postais de arte, penso que em número de vinte, intitulada, Santarém Monumental, numa edição da Casa Ruivo Júnior, de Santarém e de que penso houve pelo menos duas edições.

Aposentou-se na década de sessenta e agora com mais tempo disponível, realiza dúzia e meia de quadros dedicados à Quinta de Vale de Lobos, reproduzindo com mestria os locais e conjuntos mais significativos e onde viveu e faleceu o historiador Alexandre Herculano.

Este conjunto de obras veio a ser adquirido pela Câmara Municipal de Santarém que o homenageou na passagem do 1º Centenário do seu nascimento e no qual se incluiu a exposição destes trabalhos.

Manteve-se sempre fiel à escola que abarcou.

Encontra-se representado em museus nacionais e estrangeiros, em colecções particulares e em vários organismos oficiais de Santarém e de Setúbal.

Augusto Braz Ruivo veio a falecer na Póvoa de Santo Adrião em 6 de Novembro de 1983, ficando sepultado no cemitério de Loures.
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Santarém no Tempo, Virgílio Arruda, 1971
Santarém – Raízes e Memórias, José Campos Braz, 2000
“O 1º Centenário do Pintor Braz Ruivo, Prof. Doutor Joaquim Veríssimo Serrão, in Correio do Ribatejo de 13 de Abril de 2006-10-29
“Câmara de Santarém homenageia o pintor Braz Ruivo no centenário do seu nascimento, Correio do Ribatejo de 5 de Maio de 2006


Pequena nota do autor

Conheci na minha juventude este grande artista que era amigo de infância de meu pai e que quando se encontravam não deixavam de dar dois dedos de conversa. Foi numa situação dessas que o conheci. Era uma figura imponente, alto, forte e de grande gentileza. Procurava sempre ver os seus trabalhos que muito apreciava. Guardo como relíquia duas colecções dos seus postais, que recebi de meu pai.

sábado, 25 de dezembro de 2010

Falsário em Vilgateira?

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 1 DE SETEMBRO DE 2008)

[Rua em Vilgateira. Foto JV, 2010]

Nas leituras que habitualmente fazemos, aqui e ali, ora em documentos originais existentes em vários departamentos para o efeito criados, ora em livros de especialidade, quando menos esperamos encontramos algo que nos interessa e surpreende. Foi o que aconteceu já há bastante tempo quando fomos desfolhando e lendo o valiosíssimo trabalho Archivo Historico Portuguez, Vol. – III, Lisboa, 1915 e em “A Chancellaria de D. Afonso V”, da responsabilidade de Braamcamp Freire e a pág. 415 encontrámos um interessante despacho.

A Chancelaria Régia era um departamento que funcionava junto do rei e onde eram elaborados, autenticados e expedidos os diplomas régios e onde trabalhavam vários funcionários sob a chefia do chanceler-mor.

D. Afonso V passa grande parte do ano de 1446, no Ribatejo, principalmente nos seus Paços de Santarém, onde a 22 de Março é dado o seguinte despacho:

Fernão Lourenço de Villa Gateira, escudeiro do Infante D. Pedro, enviou dizer que algumas pessoas deram delle certos capítulos e denunciações enfamando, que elle com outras pessoas fora e era em conselho e companha de se fazer moeda falsa, etc. Foi preso; fugiu, tendo mais de setenta annos, em cima do rocim em que o levaram para a cadeia.
Carta de perdão. El Rei o mandou per Alvarenga e Luís Martinz. – fl. 20 v.

A aldeia de Vilgateira, em meados do século XV devia de ter alguma importância pois lá residia um escudeiro do Infante D. Pedro que nessa altura, apesar do rei ter atingido a maioridade, solicitou-lhe que continuasse a governar a Nação.

O Fernão Lourenço, acusado de fazedor de moeda falsa, quando era levado para a prisão, em cima de um rocim (cavalo fraco ou pequeno), apesar dos seus setenta anos, foge.

Depois, acaba por obter carta de perdão, possivelmente com a mãozinha do seu amo.

Se alguém pensa que estas coisas são de agora, por aqui se vê que são bem velhinhas!

O Algarve em João Arruda

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 2 de MAIO DE 2008)

Agora que se passaram os 117 anos deste velho Amigo que nós conhecemos há cerca de seis décadas, interessará referir, e nunca é demais fazê-lo, aquele que o criou e que não foi, exclusivamente um conhecedor da região onde nasceu e desenvolveu a sua plurifacetada actividade.

Para nossa surpresa, quando desfolhámos há anos o Volume I, A – B da ALGARVIANA – Subsídios para uma bibliografia do Algarve e dos autores algarvios, de autoria de Mário Lyster Franco, advogado, político, jornalista e escritor, outro homem muito versátil e que muito deu à sua região natal, encontrámos, a páginas 169 e 170 a seguinte referência ao fundador deste semanário:

[João Arruda]
ARRUDA (João) Escritor e jornalista, nascido em Santarém, a 18-XI-1868, e falecido na mesma cidade, a 14-V-1934. Na sua terra desempenhopu diferentes cargos públicos e fundou e dirigiu o semanário Correio da Extremadura, aparecido em 1891 e que, com o nome de Correio do Ribatejo, ainda se publica, desde a sua morte sob a direcção de seu filho, o advogado, escritor e académico dr. Virgílio Arruda. Nesse jornal publicou artigos de real valia e entre eles curiosas impressões de viagens que realizou a diferentes pontos do País e do estrangeiro. Figuram entre eles, publicada em 1905, uma série expressamente consagrada ao Algarve, que visitou por essa altura e que, reunidas em volume, com outras de várias regiões, constituem o livro

Cartas d`um viajor – 1908 – Typographia do Correio da Extremadura – editora – Santarém

In 4.º, 14,3x9, de 10-298-6 pp., sendo destas, 1 de erratas, 1de índice e 4 em br.. A capa, impressa a cores, reproduz vários aspectos das regiões visitadas e a parte que interessa a estes Subsídios. Intitulada No Algarve, comporta 8 capítulos, precedido cada um do respectivo sumário, é datada de Junho – 1905 e vai de pp. 67 a 129.

Além deste texto traz a capa do livro referido.

[Mário Lyster Franco]
Numa nota de rodapé refere: Igualmente nascido em Santarém (Virgílio Arruda), onde desfruta de grande prestígio, é também escritor de brilhantes qualidades, com valiosos trabalhos publicados. Amigo muito dedicado do Algarve e frequentador relativamente assíduo das suas praias, nunca deixa de registar também as suas impressões colhidas entre nós, em interessantes artigos que dá à estampa no jornal que dirige e nos semanários de Faro, Correio do Sul e Folha de Domingo de que é eventual colaborador.

O autor do trabalho que referimos foi várias vezes referido neste jornal pelo Dr. Virgílio Arruda, incluindo o seu falecimento ocorrido em 1984.

Infelizmente da ALGARVIANA só saiu o volume que referimos e já se passaram vinte e seis anos!

João Arruda, continua presente e teremos sempre coisas novas para nele encontrar, se as procurarmos.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Fróis Machado

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 17 DE NOVEMBRO DE .2006)

Nascido naquela que foi a velha Scalábis, em 1759, Gaspar Fróis Machado veio a tornar-se um notável gravador que muito honra a terra onde nasceu.

Iniciou os seus estudos em Mafra, na Escola de Ginoti, onde se manteve durante quatro anos., aproveitando ao mesmo tempo para estudar com Joaquim Carneiro da Silva.

Com vinte e um anos, acompanha para Roma, Pagliarino, que se tinha refugiado em Portugal por ter feito imprimir naquela cidade, sem autorização, a obra Tentative Théologique. Uma vez amnistiado, regressou àquela cidade.

A protecção que lhe foi prometida, não decorreu como esperava, aproveita contudo as lições do conhecido gravador Volpato. Foi com este e com Carneiro da Silva que se aperfeiçoou no processo do buril.

Foi um artista de extraordinários recursos, tendo praticado todos os géneros, desde o simples registo às grandes chapas alegóricas.

[Gravura executada por Fróis Machado]
No retrato, foi do melhor que se produziu em Portugal no século XVIII, equivalendo-se aos melhores artistas do estrangeiro.

É considerado de grande merecimento o retrato que fez de D. Maria I, segundo desenho de Hichey. Igualmente realizou os de D. José, príncipe do Brasil, Padre Teodoro de Almeida e do Marquês de Angeja, D. Pedro de Noronha.

São igualmente notáveis as suas alegorias, entre as quais se destacam a dos “Reis no trono”, composta por seu irmão mais novo, a do “Infante D. João”, o “Nascimento da Princesa da Beira” e “Estátua Equestre de D. José I”.

Gravou uma estampa da Torre de Belém que veio a ser oferecida por Niel ao Duque de Lafões em 1783.

Nas estampas religiosas, efectuadas com grande rigor técnico, destacam-se:. Nossa Senhora das Dores, S. Filipe de Nery e Nossa Senhora do Rosário.

Pretendendo ainda melhorar os seus conhecimentos técnicos, Fróis Machado procura estudar em Inglaterra com Bartollozzi mas o navio em que seguia naufragou, contando-se o artista entre as vítimas.

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Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Vol.11

Lello Universal, Dicionário Enciclopédico Luso-Brasileiro, 2 Vols., Porto, 1975.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Rafael Marques

Rafael da Silva Marques, de seu nome completo, nasceu em Santarém em 31 de Janeiro de 1885.

Frequentou a Escola Politécnica de Lisboa que abandona.

Aos dezasseis anos apresenta-se no Coliseu dos recreios, exibindo-se como faquir. Com a Companhia do Circo percorre as nossas colónias de África e desloca-se à América do Sul.

Como actor de teatro faz a sua estreia em 1905, no então teatro D. Amélia, na peça “A Cruz da Esmola, de Eduardo Schwalbach e integrado na Companhia Rosas & Brazão.

Em 1907 parte para a Bélgica com uma pensão do Estado a fim de obter o curso de engenheiro electricista, o que não veio a acontecer, indo viver para Paris.

Regressando a Portugal volta ao Teatro D. Amélia onde se mantém algum anos.
Com o incêndio neste teatro, em 1914, passou com a mesma Companhia para o de S. Carlos até 1916, altura em que é contratado para o antigo Éden Teatro, pelo empresário, Luís Galhardo.

Por aí se mantém até 1920, altura em que ingressa no Teatro Nacional Almeida Garrett onde trabalha com Eduardo Brazão e obtém grandes êxitos. Aí foi sócio, gerente e director de cena.

Com Ilda Stichini, em 1925 formou uma efémera Companhia, abandonando o teatro quatro anos depois.

Dedica-se então ao comércio e chega mesmo a Inspector de fronteiras, fazendo uso da língua francesa que falava correctamente.

Em 1930 já se encontra novamente no ambiente que sempre preferiu, o teatro, trabalhando no Teatro Apolo, de que foi empresário, obtendo aí grandes êxitos, como na peça “O Mártir do Calvário”, na qual interpretou o papel de “Cristo”.

Integrado na Companhia do D. Amélia, com actores como Eduardo Brazão e Adelina e Aura Abranches, actuou várias vezes na Brasil.

Falece em Lisboa no dia 16 de Novembro de 1939, altura em que trabalhava no filme João Ratão, nos estúdios da Tobis Portuguesa.

Era condecorado com a Ordem de Santiago de Espada.

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Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Vol. 19
Santarém no Tempo, Virgílio Arruda, 1971

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Bater em padre é sacrilégio

Pequena Nota
Caro Visitante/leitor

O “Correio das Lembranças” foi criado fundamentalmente para aqui repor o que fui publicando no centenário jornal da minha cidade, o Correio do Ribatejo, ao longo dos anos, sendo uma maneira de hipotéticos interessados a eles terem acesso.

O primeiro escrito que publiquei e incluído em Temas Varzeenses teve por título A Capela de Santo António, “Ex-libris” de Vilgateira e foi publicado no número de 22 de Fevereiro de 1991 e ilustrado com um desenho a tinta-da-china que executei para o efeito.

O texto e o desenho foram, entretanto, aqui reproduzidos.

Com a publicação de A Freguesia da Várzea (do concelho de Santarém) – Achegas para uma monografia, 2005, o mesmo desenho foi incluído a pág. 139.

Até aqui tudo normal.

Em princípios de Dezembro, sou contactado por e-mail com o pedido de autorização formulado por Saint-Clair Mello (Brasil) de permitir a utilização do meu desenho num texto que iria publicar no seu espaço ASFALTO & MATO, o que naturalmente autorizei e agradeci.

Sem dúvida que foi uma honra para mim o meu desenho ter sido escolhido entre muitas centenas, para não dizer milhares.

O texto muito interessante e bem escrito reflecte uma época que todos nós conhecemos e tem a vantagem de ser baseado em factos verídicos, segundo o autor nos veio a confessar.

Tudo isto me levou a publicar neste espaço, depois do consentimento do autor, o interessante artigo acompanhado do desenho e das palavras que teve a amabilidade de me dirigir.

Os meus leitores conterrâneos e não só ficarão a saber por onde anda o desenho da nossa capelinha de Sto. António.

Caro leitor: Não deixe de visitar o ASFALTO & MATO, onde além de prosa interessante encontra excelente poesia do nosso já Amigo, Saint Clair Mello a quem muito agradecemos.

JV



Postado em 10 de Dezembro de 2010, por Saint-Cair Mello

Nos primórdios da vila de Santo Antônio da Liberdade, hoje conhecida por Carabuçu, houve um padre que lá foi estabelecer seus rebanhos de fiéis, de gado e de mulheres.

Naquela época, as disputas de terra eram sangrentas. Terra nova, inexplorada, aberta à grilagem do mais esperto, do mais poderoso.


Prestígio de padre pode ser discutido no céu, por anjos e santos, não em lugarejos perdidos do interior. Assim, montado em seu prestígio, o padre abocanhou alguns alqueires de terra, onde plantou café, criou gado, fixou colonos, construiu uma bela sede de fazenda. Ministrava os sacramentos e administrava seus domínios com competência canônica.

Mas padre é gente, é homem, por isso capaz de pecar tão desavergonhadamente como qualquer mortal. Ocorre, porém, que o padre decidiu pecar justamente com Lucinda, sertaneja prendada, bem apessoada, olhar de Capitu. Sua fiel, é verdade, embora mais fiel do coronel Napoleão, que a trazia alinhada como cavalo de charrete.

Foi o que bastou para que o coronel se destemperasse, perdesse a fé e o respeito pelas coisas sagradas e mandasse recado destabocado para o padre.

- Nicandro, diz lá pro padre Ambrósio que vou lhe dar uma sova, pra ele aprender a se meter com menina alheia.

O mulato foi e voltou com a resposta do padre:

- Diz lá pro seu coronel que em padre só se pode bater acima da cabeça, caso contrário é sacrilégio, punido com excomunhão.

Coronel Napoleão não gostou da resposta atravessada do homem de Deus e tomou as providências cabíveis: mandou pendurar o padre de cabeça para baixo no galho de uma figueira e desceu-lhe a gurumbumba, até sua reverendíssima resolver abrir mão de fazenda, de Lucinda e de paróquia.

De seu, a única coisa que o padre deixou por aqueles arredores foi uma meia dúzia de meninos, que, nas noites de sexta-feira de lua cheia, andavam virando lobisomem e mula sem cabeça.

Agradecimentos a José Varzeano pela cessão de seu belo desenho a ilustrar este texto.)

domingo, 12 de dezembro de 2010

Manuel Neves

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 3 NOVEMBRO DE 2006)

Jornalista, autor dramático e tradutor.

Nasceu na Ribeira de Santarém em 5 de Julho de 1875.

Aos treze anos é compelido a deixar o liceu de Santarém e inicia a aprendizagem da profissão de tipógrafo no Correio do Ribatejo que na altura se designava Correio da Extremadura visto ainda não ter sido criada a província do Ribatejo, o que só aconteceu muitos anos depois.

Como o semanário foi criado em 1891, existe aqui uma pequena diferença mas temos que atender que antes deste já João Arruda tinha dado outros a público.
Manteve-se nesta actividade até 1898.

Autodidacta, era atraído para a literatura e principalmente para o jornalismo, gosto possivelmente adquirido no jornal onde trabalhou.
Manuel Neves tinha menos cerca de sete anos do que João Arruda, outro autodidacta de grande valor que pisou caminhos semelhantes, tendo ambos nascido na parte baixa da cidade.

A cultura que foi adquirindo possibilitou ser professor do ensino primário em 1899.
Tendo sempre por fim o exercício do jornalismo, consegue entrar para a redacção do “Folha do Povo2”, de Lisboa, onde depressa dá provas das suas excepcionais qualidades.

Passa depois e sucessivamente pelo “O País”, “O Diário”, “Jornal da Noite”, O Intransigente” e por último pelo “O Século” (1911) onde exerceu a função de subchefe de redacção. Tanto escrevia o artigo de fundo como a mais insignificante notícia!
Para o teatro escreveu a peça em um acto Romantismo, premiada em mérito absoluto num concurso aberto pelo jornal “O Dia”.

De colaboração, escreveu a peça em quatro actos Um Lar, representada no Teatro Nacional em 21 de Junho de 1908.

Escreveu ainda uma opereta em três actos que intitulou Intrigas de Amor.
Traduziu variadíssimas obras, entre as quais “Le Satyre”, “A Viúva Alegre” “Sonho de Valsa e vários romances que foram publicados em “O Século”.

Reformou-se em 1952 e passou a colaborar no Século Ilustrado, escrevendo ainda várias revistas teatrais.

“O Século”, jornal onde trabalhou tantos anos veio a homenageá-lo.

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Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Vol. 18 e 40

Santarém no Tempo, Virgílio Arruda, 1971

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Natércia Freire

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 27 DE OUTUBRO 2006)



Poetisa, prosadora, compositora musical, professora do ensino primário, foi Natércia Ribeiro de Oliveira Freire, conhecida no campo literário por Natércia Freire e que viu a luz do dia em Benavente, aos 28 de Outubro de 1920.

Publica o seu primeiro livro (poesia) “Castelos de Sonho” em 1938 e continua a fazê-lo com regularidade. “Meu caminho de Luz”(1939), “Estátua”(1942), “Horizonte Fechado” (1942), “Rio Infindável”(1947-Prémio Antero de Quental), “Anel de Sete Pedras”(1952 – igualmente Prémio Antero de Quental), “Poemas” (1957), “Poesias Escolhidas (1959), “Poemas e Liberta em Pedra” (1964), “A Segunda Imagem” (1969), “Os Intrusos (1971 – Prémio Nacional de poesia, ex aequo com David Mourão Ferreira), “Liberdade Solar” (1977) Obra poética, 2 vols. (1994), foram os trabalhos que se seguiram.

Em 1964 recebe a “Medalle D`Or de Mérite National Français e em 1966 o “Diplome D`Honneur da Academie de Jeux Floraux de Loine-Ocean”.

Obteve o Prémio Nacional de Poesia em 1971.

Quanto a prosa, publica: “Irmão (romance), “A Alma da Velha Casa” (1945 – contos), “Infância de que nasci” (1955-Prémio Ricardo Malheiros), e “Não vás, minha Gazela”, novela (1957).

Organizou a monografia “Ribatejo”.

Publicou contos e novelas por várias revistas em que colaborava, como Atlântico, Ocidente, Acção, Portucale, Vida Ribatejana, etc.

Durante vinte anos dirigiu o suplemento Artes e Letras do Diário de Notícias e a seu convite obtém a colaboração de autores como Vergílio Ferreira, Agostinho da Silva, Urbano Tavares Rodrigues, David Mourão-Ferreira, João Gaspar Simões, Domingos Monteiro, José Régio, Sophia de Mello Bryner, Jacinto Prado Coelho, Jorge de Sena, Natália Correia, etc.

Além da colaboração em jornais e revistas portuguesas, fá-lo também em relação ao Brasil, Itália, Espanha, Bélgica, Suiça e França.

Os seus trabalhos poéticos encontram-se traduzidos em francês, inglês alemão, italiano e espanhol. Em sentido contrário, igualmente se dedicou à tradução.
No campo musical que igualmente cultivou, compôs “Canção quimérica, “Álbum de canções portuguesas e “Volta meu amor!”

Faleceu em Lisboa em Dezembro de 2004.

A Câmara Municipal de Benavente, com o patrocínio da Companhia das Lezírias e a colaboração da Associação Portuguesa de Escritores, instituiu em 2005, o Prémio de Poesia Natércia Freire, em sua homenagem.
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Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Vol. 11

“Alguns Valores da Província do Ribatejo”, Octávio R. de Campos, em Vida Ribatejana, Número Comemorativo – 1940

“Figuras Notáveis do Ribatejo”, Jorge Ramos, em Correio do Ribatejo de 26 de Janeiro de 1979

Lello Universal, Dicionário Enciclopédico Luso- Brasileiro 2 Vols. Porto 1975
Enciclopédia Verbo Luso-Brasileira de Cultura, Edição Século XXI

Regulamento do Prémio de Poesia “Natércia Freire", Câmara Municipal de Benavente, 2005

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Os arelhos

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 8 DE JUNHO DE 2007 E-REPUBLICADO NO BLOGUE ALCOUTIM LIVRE EM POSTAGEM DE 17 DE SETEMBRO DE 2008)

[Arelhada]

Há quase um ano que não escrevo sobre a freguesia da Várzea devido a vários factores que vão desde a falta de tempo até à lembrança de um assunto que me desperte a atenção e possa construir com aquilo que a memória foi acumulando no decorrer dos anos e uma análise simplista que nos reporte aos dias de hoje.

Do norte a sul do País o homem em períodos de crise, motivados por intempéries e situações políticas complicadas, recorreu muitas vezes às plantas espontâneas para uso alimentar o que acabou, nalguns casos, por dar origem a hábitos e usos gastronómicos que se foram transmitindo no decorrer dos anos, mesmo àqueles a que a vida corria melhor.

Celgas, labaças, cagarrinhas (cardos de folha larga que depois de esfolados se aproveita a nervura central), beldroegas, espargos, túberas, míscaros e outras espécies de cogumelos, serralhas, leitugas, agriões e arelhos, são algumas das espécies utilizadas, cozidas, fritas, guisadas ou cruas, mais propriamente em saladas.

Além disso não podemos esquecer o tempero aromático dos orégãos, da hortelã da ribeira, da erva das azeitonas, do funcho, do alecrim, do poejo e da carqueja, entre muitas outras.

Tenho verificado que a mesma planta tem utilizações diferentes, conforme a região. Enquanto na Várzea só conheço o uso das beldroegas (vulgo valdoregas) em salada, na Serra algarvia utilizam-na na sopa e nos “jantares” que constituem uma espécie de cozido. Por outro lado, as celgas que os varzeenses utilizam em sopas de feijão, naquela zona do sul do país comem-se cozidas.

Vem isto a propósito de há cerca de dois meses ter recebido telefonicamente um convite nos seguintes termos:- Então não quer vir amanhã comer uns arelhos com bacalhau, feitos por um conterrâneo para um grupo de amigos, igualmente varzeenses? Só não são comidos na Várzea, mas numa zona bem próxima.

O convite era tentador, primeiro porque ia saborear um prato que muito aprecio e que já não comia à volta de quarenta anos, segundo porque ia ter a oportunidade de conhecer alguns conterrâneos, que me conheciam de nome, através deste jornal, convivendo com outros já conhecidos, trocando impressões sobre a nossa terra e procurando enriquecer os nossos conhecimentos, já que a oralidade é sempre uma via importante de transmissão.

Além dos arelhos guisados com bacalhau e batatas, sou apreciador de sopa de feijão (ou feijoca) com celgas e todos os anos mato o gosto, porque me é fácil apanhá-las, pois sei confeccionar a sopa. Neste caso, não substituo as celgas pelas melhores couves do Mundo! Para a sua adequada confecção, é necessário conhecer algumas passagens que nem todos praticam ou conhecem.

[Prato de arelhos guizados com bacalhau. Foto JV]

Com os arelhos, não acontece o mesmo. Nunca apanhei tal coisa, ainda que saiba, porque o meu pai mo dizia, criavam-se bem nas vinhas, local onde os procurava.

Nos dicionários que consultei, Novo Dicionário da Língua Portuguesa, Francisco Torrinha, 1946, Lello Universal – Dicionário Enciclopédico Luso-Brasileiro, Porto, 1975, Dicionário da Língua Portuguesa, por Almeida Costa e Sampaio e Melo “Editora”, 5ª Edição, 1977 e por último o Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, Academia das Ciências de Lisboa – Verbo, 2001, não encontrei o substantivo arelho mas sim alhos-porros e alhos da vinha (espontâneos nas vinhas), entre outros. Estas duas designações presumo que sejam sinónimas de arelhos.

Existe o topónimo Foz do Arelho que José Pedro Machado pretende significar areia (Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, Horizonte /Confluência, 1993) e a Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Vol 3, pág 172 refere o mesmo topónimo existente no concelho da Caldas da Rainha e de uma ribeira que nasce na Serra de Montejunto que se junta à de Arnoia, próximo da lagoa de Óbidos.

Vim a encontrar os mesmos alhos espontâneos na Serra Algarvia, igualmente utilizados na alimentação, mas aqui com um desenvolvimento muito inferior devido às terras serem mais delgadas e conhecidos por alhos-areios, designação que igualmente não encontrei nos dicionários que já referi.

Enquanto na Várzea e zonas circunvizinhas só se aproveita a “cabeça”, na Serra Algarvia aproveitam igualmente a rama (folha) e cozinham-nos de uma maneira totalmente diferente da do Ribatejo, com sopa de pão e fatias de toucinho. Constituem igualmente um bom petisco!

Até hoje nunca encontrei o bacalhau guisado com arelhos em qualquer restaurante que diz servir pratos regionais o que sempre me admirou, pensando eu que seria um prato típico da região completamente perdido.

Pelo que me foi dado ver, meia dúzia de conterrâneos fazem gala de manter a tradição gastronómica dos “arelhos” confeccionando-os com prazer e mestria, mantendo a sua originalidade.

Não compliquem com adicionamentos que possam desvirtuar ou lhe tirar a pureza. É só necessário manter o tradicional, o que por vezes não é fácil.

Procurem transmitir aos vossos descendentes as tradições gastronómicas.

Agradecido pelo convite.

Satisfizemos o estômago e a mente.

Muitos anos de vida para a “Confraria dos Arelhos”.

sábado, 4 de dezembro de 2010

Nepomuceno de Macedo

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 5 DE MAIO DE 2006)

João Nepomuceno de Macedo nasceu na Chamusca no dia 15 de Maio de 1793, sendo filho de António Eliseu Raimundo de Macedo e de sua mulher, D. Teresa Faustina Challamar.

Segue a carreira das armas assentando praça em Cavalaria 10 em 1809 e em 31 de Agosto de 1813 já era tenente.

Tomou parte na Guerra Peninsular e ofereceu-se para fazer parte da expedição ao Rio da Prata, sendo já capitão.

Comandada por Carlos Lecor, depois de chegarem ao Rio de Janeiro, passaram a Santa Catarina, defrontam e destroçam um dos chefes rebeldes e continuam a marcha até à praça de Maldonado, acabando por entrar em Montevideu, tudo isto para fazer respeitar as fronteiras do território português que então o Brasil representava.

No combate de Índia Morta (19.10.1816) por ter sido gravemente ferido o comandante de dois esquadrões de Cavalaria e morto o major Duarte Mesquita, seu imediato, o jovem oficial assume o comando com bravura e denodo, sendo por isso graduado no posto de major, o que acaba por se tornar definitivo, sendo nomeado comandante do 1º Regimento de Cavalaria da Divisão de Operações.

Toma então parte em vários combates sempre com notoriedade e intrepidez.

Regressa ao Reino e adere à causa liberal.

É promovido a tenente-coronel em 15 de Agosto de 1826 mas em 1828 já se encontrava exilado em França.

Alcançando a ilha Terceira, nos Açores, que funcionava como refúgio e baluarte dos liberais, tomou parte no desembarque do Mindelo, vindo a ganhar renome pelos seus feitos no cerco do Porto.

Quando tropas miguelistas tinham conseguido penetrar nas defesas da praça e chegar, depois de tomar uma barreira levantada na estrada de São Cosme, João de Macedo comandando uma pequena força de vinte e três homens, carrega o inimigo fazendo gorar a arremetida que parecia vitoriosa, salvando assim a cidade de ser ocupada pelos partidários de D. Miguel.

Foi promovido a coronel a 6 de Agosto de 1832 e a brigadeiro em 2 de Julho de 1833.

Por decreto de 12 de Maio de 1835 foi agraciado com o título de Barão de São Cosme.

Era comendador das Ordens de Avis e Torre e Espada, condecorado com a medalha da Guerra Peninsular e com a Estrela de Ouro da Campanha do Rio da Prata.

Tombou no combate de Chão da Feira, próximo da vila da Batalha, o que igualmente aconteceu ao Conde de Redinha, quando comandava sob as ordens de Saldanha, uma força de Cavalaria que arremeteu contra um batalhão de Caçadores do então Barão do Bonfim.
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Nobreza de Portugal e do Brasil, Edições Zairol, lda. (dir. coord. E comp. De Doutor A. Martins Zúquete

Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira

Portugal Militar, Carlos Selvagem, INCM, 2ª reimpressão, 1993

Tradição e Revolução, uma biografia do Portugal Político do séc. XIX ao XXI, José Adelino Maltez, Vol I (1820-1910), pág. 269

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Peixoto Barreto

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 17 DE DEZEMBRO DE 2004)



Nasceu a 22 de Fevereiro de 1580, em Pontével, actual freguesia do concelho do Cartaxo, este eclesiástico a quem foi dado o nome de Mateus Peixoto Barreto.

Cursou a Universidade de Coimbra, onde se licenciou em cânones.

Foi cónego da Sé de Lisboa, desembargador e chanceler da Relação Eclesiástica.
Deputado da inquisição de Coimbra em 1617, exerce as mesmas funções em Lisboa, dois anos depois.

Fundou em 1619, nas casas onde tinha nascido, o Recolhimento de São Dâmaso, destinado a viúvas e donzelas pobres, tendo para o efeito instituído um morgado.

Faleceu em Lisboa no dia 14 de Janeiro de 1641, sendo sepultado, como tinha determinado, na ermida de S. Dâmaso, capela do Recolhimento.

A instituição foi extinta em 1758, tendo tudo desaparecido, incluindo o seu túmulo.
Dedicou-se à investigação histórica e à genealogia, deixando manuscritas algumas obras como: Cronologia da Sé de Lisboa, Nobreza Lusitana na Colecção de Títulos de Muitas Famílias do Reino, Memórias Genealógicas da Família dos Peixotos, Colecção dos Brasões que estão Registados na Torre do Tombo. Etc.

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Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira , Vol. IV
Boletim da Junta de Província do Ribatejo , 1937 – 40
"Pontével através dos tempos", A .H.Barata, in Correio do Ribatejo de 5 de Novembro de 1976.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Quem é aquele Senhor?

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 8 DE OUTUBRO DE 2004)




Quando Bernardo de Figueiredo faleceu em Palma de Maiorca, aos setenta e três anos, e já se passaram três, não me encontrava na minha residência oficial e para onde me é enviado o “Correio do Ribatejo”.

Nessas alturas, o meu afastamento do “Mundo” é quase total, pelo que só tive conhecimento do funesto acontecimento quando regressei e li os vários jornais que entretanto tinham chegado.

Naturalmente que a notícia é acompanhada por dados biográficos oriundos de vários quadrantes, desenhando e pondo em relevo o percurso do que era então classificado como o decano dos jornalistas de Santarém e que tinha sobre os seus ombros a difícil missão de substituir, o Dr. Virgílio Arruda, grande jornalista e escritor (homem de Cultura) que no campo da história escalabitana, deixou vasta obra em trabalhos publicados e nos milhares de páginas escritas no seu e em outros jornais e revistas.

Quando Bernardo de Figueiredo era um homem, era eu um rapazeco que sempre reparei naquela figura esguia, testa alta, cabelo liso, puxado para trás, passo cadenciado, fato inteiro e invariavelmente com livros ou jornais debaixo do braço, descendo a avenida do MEU BAIRRO.

Aquela figura mexia comigo e um dia, já próximo dos muros do antigo hospital de Jesus Cristo, aproveitei a companhia de meu pai e perguntei-lhe:- Quem é aquele senhor ? A resposta não se fez esperar:- É jornalista, escreve para os jornais.

Penso que nesta altura já era casado, (ou namoraria aquela que veio a ser sua esposa) que eu conhecia igualmente de vista, do MEU BAIRRO. Julgo que sempre teriam morado na Rua 2º Visconde de Santarém cujo último quarteirão então constituía uma das partes novas do MEU BAIRRO e onde as construções já começavam a ser de dois pisos. Deixei o MEU BAIRRO em fins da década de cinquenta, dando início na Beira-Alta à minha vida profissional, começando então a receber semanalmente, sem nunca ter falhado uma semana, este velhinho jornal que comecei por ler na barbearia do MEU BAIRRO.

Na segunda metade da década de oitenta, comecei a compilar elementos sobre a minha freguesia natal, percorrendo passo a passo o seu território, recolhendo usos e tradições, investigando o arquivo da Junta de Freguesia e procurando algo que estivesse escrito sobre ela, ainda que vivesse distante.

Com o trabalho desenvolvido foi-me possível organizar um “volume” dactilografado que intitulei A Freguesia da Várzea (do concelho de Santarém) - achegas para uma monografia que não veio a ser publicado por falta de conjugação de esforços.

Atendendo a que os destinatários principais deste humilde trabalho eram os meus conterrâneos, pensei em transformá-lo em escritos a publicar, se possível, no Correio do Ribatejo.

Nesta altura já dirigia o semanário, Bernardo de Figueiredo que solicitado a isso, deu a sua adesão. Foi assim que entre 22 de Janeiro de 1991 e 10 de Julho de 1992 foram publicados cinquenta e dois escritos sob o tema “Temas Varzeenses”.

Tivemos então oportunidade de nos conhecermos pessoalmente, conhecendo ele, naturalmente as minhas raízes com as indicações que lhe dei.

Nas poucas vezes que falámos, trocávamos impressões, transmitia-me os comentários que lhe faziam sobre os escritos e principalmente a procura da minha identificação que nunca fez, sem a minha autorização.

Bernardo de Figueiredo certamente me desculpará que aqui transcreva um pequeno trecho da carta que teve a amabilidade de me escrever e datada de 4 de Abril de 1992.

Lamento que os seus artigos sobre os temas Varzeenses, estejam a chegar ao fim, pois têm desfrutado o maior interesse. Contudo, tomo a liberdade de lhe sugerir que escreva sobre outros assuntos. O jornal está inteiramente aberto à sua (...) colaboração. Por isso, vá pensando no assunto.

Foi assim que vieram a aparecer AS MEMÓRIAS DO MEU BAIRRO e as FIGURAS RIBATEJANAS, que ainda se vão mantendo, aliás como os TEMAS VARZEENSES, ainda que esporadicamente.

Como fica demonstrado, isso se deve a Bernardo de Figueiredo.

Está tudo ou quase tudo dito sobre José Bernardo de Figueiredo Duarte. Nunca li contudo qualquer referência à sua habilidade nata para o desenho e pintura. Vi um ou outro trabalho seu, de jovem, publicado no jornal e se não estou errando ilustrou um convite de casamento de um familiar próximo. Esta conversa veio a propósito dos meus bonecas que têm ilustrados alguns dos meus escritos.

QUEM É AQUELE SENHOR ?

Hoje digo:- Uma FIGURA RIBATEJANA, uma personalidade do MEU BAIRRO.
Aqui ficam estas despretensiosas palavras que a mim mesmo prometi escrever de simples homenagem a um jornalista que honrou a sua Terra e o seu BAIRRO.