domingo, 13 de fevereiro de 2011

Um fantasma chamado bicicleta

(PUBLICADO NO CORREIO DO RIBATEJO DE 16 DE JANEIRO DE 2009)

Há quanto tempo eu não escrevo uma MEMÓRIA DO MEU BAIRRO!

Tive que recorrer ao meu arquivo pessoal para me certificar!

A LXVI teve por título UM POETA e foi publicada em 13 de Abril de 2006! Já lá vão quase três anos!

A falta de publicação não tem a ver com a menor falta de interesse pela rubrica, mas sim pela falta de assuntos que venham à nossa memória.

Quem escreve principalmente sobre o passado, como acontece comigo, tem que encontrar assunto para o fazer, que aparece quando menos se espera. Salta o clique e o tema começa a germinar até dar origem a um pequeno escrito sobre o passado distante mas que a memória ainda conserva, se não com total rigor, pelo menos no que é fundamental.

Avô babado não tenho vergonha de o dizer, apesar da minha neta ainda não ter três anos, além daquilo que ela desejava, um tambor, resolvi comprar-lhe uma bicicleta com o argumento de que para o ano posso já não estar cá. Até agora não pensava nisso, mas pela idade ou pela presença da neta, já me vem muito ao pensamento.

Afinal eu não estou a escrever para falar da minha neta, mas sim de algo que me fez recuar cerca de sessenta anos.

Depois de escolhido o velocípede (tamanho, cor etc.) em casa da especialidade e não naquelas grandes que têm à porta para chamar a atenção, muitas vezes uns grandes “balões”com uns hieróglifos que desconhecemos, fomos efectuar o pagamento.

O balcão servia de montra para mostrar interessantes miniaturas de veículos de duas e três rodas, havendo um que me atraiu especialmente, prendendo a minha atenção. Tratava-se de um biciclo muito parecido com um que via circular lentamente no MEU BAIRRO e que levava toda a garotada atrás.

A roda dianteira é muito maior do que a traseira e é essa circunstância que define o biciclo.

Para nós era uma bicicleta FANTASMA com o condutor lá em cima. Bastaria isto para nos despertar a curiosidade, mas havia mais. O homem vestia um fato branco e penso que tinha um laço em vez de gravata. Usava chapéu alto (preto? branco? não posso precisar). Para ser bem ouvido, falava através de um altifalante (espécie de funil), lançando pregões no sentido de vender o seu jogo (lotaria).

Não era muito frequente a sua aparição no MEU BAIRRO, pelo contrário, mas quando aparecia funcionava como dia de festa para a rapaziada que aos magotes o seguiam, isto enquanto estivesse no bairro porque a partir daí, a grande maioria, como a mim me acontecia, não tinha autorização dos pais para ir para a cidade, como na altura se dizia. O Bairro era o bairro, a Cidade a cidade!

Se a memória não me atraiçoa, o meu pai dizia-me que aquela bicicleta era propriedade de um meu tio-avô, que a alugava aos interessados.

Certamente haverá leitores que recordarão este quadro tão bem ou melhor do que eu.

Quando irá acontecer uma nova MEMÓRIA? Não faço ideia, é preciso que o clique apareça e faça faísca.